“Bem-aventurados
os pacificadores, porque eles serão chamados filhos de Deus” – Jesus / Mateus,
5:9
Multiplicam-se
conferências e examinam-se acordos que garantam a concórdia na belicosa família
planetária.
Sangrando
embora, não encontra o continente europeu suficiente recurso para adaptar-se
aos impositivos da paz e, guardando ainda a hegemonia na técnica industrial do
mundo, imprime graves perturbações ao ritmo político da comunidade
internacional; não obstante o dilúvio de sangue que lhe cobriu o solo generoso,
não é segredo o tremendo sacrifício dos orçamentos, em favor dos programas
rearmamentistas. Existem ali multidões ameaçadas pelo inverno, faltam reservas
no balanço econômico, invoca-se o socorro de países bem aquinhoados pela
natureza; no entanto, os generais desenrolam mapas minuciosos e extensos, sob
as vistas de administradores, preocupados na ofensiva e na defensiva. Clarins
de convocação apresetam-se à chamada de jovens subalimentados, que mal procedem
de uma infância vazia de ideais reconstrutivos.
Lutava-se
antigamente pela extensão de poder, nos desregramentos do feudalismo dominador;
atritava-se ainda ontem, pelo acesso às matérias primas a fim de que a força se
sobrepusesse ao direito, no caminho dos séculos; e abeiramo-nos, agora, de
conflitos ideológicos gigantescos, em que a civilização do Ocidente sofre
indescritível ameaça aos seus mais preciosos patrimônios.
É
o ataque sutil das forças das trevas, mascaradas de liberdade que mais equivale
a desvario.
Embalde
se alinham propostas de desarmamento, porquanto, segundo já enunciou eminente
pensador, “não foram as armas que criaram os homens e, sim, os homens que
criaram as armas”. Um espírito envenenado pelo ódio, sem fuzil que lhe obedeça
as determinações, ferirá com os próprios braços e, se estes lhe faltam,
desferirá execráveis vibrações, dilacerantes e esmagadoras, como aguçados estiletes
de morte.
Infrutíferas
todas as medidas restauradoras do mundo que não atinjam a personalidade humana,
necessitada de dignificação.
A
sociedade, constituída pelo organismo doméstico, pelo agrupamento, pelo partido
ou pela nacionalidade, representa uma coleção de indivíduos e, por isso mesmo,
sem a melhoria do homem, regendo os processos de trabalho, na intimidade do lar
e do povo, é inútil a sistematização de reformas exteriores, impostas por
revoluções e guerras destrutivas.
Advoga-se
a “igualdade das oportunidades”, como fórmula ideal de socialismo cristão para
as democracias; entretanto, partindo a premissa de pensadores evangélicos, urge
compreender que essa igualdade de recursos já foi estabelecida pelo Governo
divino do Planeta. Admitido à experiência terrestre, o homem é bafejado por mil
ensejos diferentes de aprender, evolver, iluminar-se e engrandecer-se. Tão
grande “talento” é dor que aprimora quanto o dinheiro que favorece. E a
criatura que se revolta no sofrimento edificante, convertendo bênçãos em
crimes, é tão perniciosa à obra do Senhor como aquela que se vale das
facilidades econômicas para estender o domínio das trevas.
Eis
porque o problema da harmonia espiritual nunca será resolvido por ordenações
exteriores.
O
homem cristianizado é a coluna viva da democracia futura em que o reinado da
Ordem, na estrutura do Estado, não colidirá com o reino de Deus, em construção
na individualidade humana.
Não
bastam leis benignas. Requisitam-se caracteres elevados que as respeitem e
cumpram.
Não
valem somente princípios enobrecedores. São necessários corações valorosos que
aceitem as condições imprescindíveis à santificação.
A
simples denúncia da guerra não atende.
É
imperioso suprimi-la da esfera de nós mesmos, ambientando o amor e a paz na
própria vida.
À
face da superfície brilhante do oceano teórico, povoado de demonstrações
negativas, espíritos satânicos, encarnados e desencarnados, prosseguirão
assoprando o mal nos círculos da evolução terrena, derribando, conspurcando,
destruindo...
Enquanto
não se capacitar o homem da grandeza da herança que o universo lhe reserva à
condição de filho de Deus, é impossível a sublimação da humanidade.
Tanto
se guerreava no tempo de Sargão I, no apogeu da foice, quanto se luta presentemente
no fastígio da eletricidade.
No
fundo, é a rebeldia da personalidade ajustada à indiferença pelos próprios
destinos, quando não vinculada ao narcótico do vício, erigido em condutor do
homem e das massas.
A
sabedoria do Eterno, porém, transforma os males da criatura em amarga medicação
para elas mesmas. De experiência em experiência, a Europa, crucificada na
defecção dos próprios filhos, que conferiram um trono externo ao Cristo,
imaginando-o cercado de representações políticas, mas exilado dos corações em
que deveria viver e reinar, acerca-se, hoje, de cataclismos inomináveis...
Das
angústias coletivas, entretanto, surgirão claridades renovadoras.
Exorando
as bênçãos do Altíssimo para que nossos males sejam atenuados com a remoção das
nuvens que se adensam sobre os povos mais poderosos da Terra, suplicamos a
Jesus fortaleça a gloriosa esperança do Novo Mundo.
—
Grande América! Herdeira da Europa, dadivosa e flagelada, não permitas que a
chuva de sangue e lágrimas desabe em vão sobre as tuas sementeiras de
cristianismo!
Recebe
as responsabilidades da civilização, de alma voltada para Aquele que é o
Fundamento dos Séculos...
Consagra
o direito, aceitando o dever do bem, cristianiza os teus programas de governo a
fim de que o sofrimento e a expiação não te imponham renovações dolorosas!
Se
a força tiraniza o serviço libertador do Evangelho ou escarnece da razão para
perverter a inteligência, não vejas em semelhante perturbação senão o eclipse
efêmero da sombra humana procurando debalde toldar a luz divina!...
E
quando as nuvens de aflição houverem passado, quando as tormentas lavarem os
céus, possas tu ouvir nos recessos do espírito a divina palavra:
—
Bem-aventurados os pacificadores porque serão chamados filhos de Deus!
Ser-te-á
possível então responder, de consciência erguida para o alto:
— Bendito seja o Príncipe das Nações!
Revista Reformador - janeiro
de 1948
Livro: O Evangelho por Emmanuel – Comentários ao
Evangelho Segundo Mateus
Francisco Cândido Xavier,
pelo Espírito Emmanuel,
coordenação de Saulo
Cesar Ribeiro da Silva
FEB – Federação Espírita
Brasileira
Nota da equipe
organizadora:
Este comentário foi
escrito durante a Segunda Guerra Mundial e nos traz uma notável reflexão sobre
aquele grave momento da história da humanidade. Quando muitos cediam ao
desespero e ao pessimismo, Emmanuel estabelece um vínculo entre aquelas
circunstâncias e o Evangelho, demonstrando que em todas as épocas poderemos
encontrar consolo e esperança nas palavras de Jesus, e que os desígnios de
Deus, apontando sempre para o bem, o progresso e a paz, podem ser turvados
momentaneamente pelas sombras passageiras, mas estas jamais serão capazes de
obstá-los de maneira definitiva.
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