A beleza, do
ponto de vista puramente humano, é uma questão muito discutível e muito
discutida. Para a apreciarmos bem, precisamos estudá-la como amador
desinteressado. Aquele que estiver sob o encantamento não pode ter voz no
capítulo. Também entra em linha de conta o gosto de cada um, nas apreciações que
se fazem.
Belo, realmente
belo só é o que o é sempre e para todos; e essa beleza eterna, infinita, é a
manifestação divina em seus aspectos incessantemente variados; é Deus em suas
obras e nas suas leis! Eis aí a única beleza absoluta. É a harmonia das harmonias
e tem direito ao título de absoluta, porque nada de mais belo se pode conceber.
Quanto ao que se convencionou chamar belo e que é verdadeiramente digno desse
título, não deve ser considerado senão como coisa essencialmente relativa,
porquanto sempre se pode conceber alguma coisa mais bela, mais perfeita.
Somente uma beleza existe e uma única perfeição: Deus. Fora dele, tudo o que adornarmos
com esses atributos não passa de pálido reflexo do belo único, de um aspecto
harmonioso das mil e uma harmonias da Criação.
Há tantas
harmonias, quantos objetos criados, quantas belezas típicas, por conseguinte,
determinando o ponto culminante da perfeição que qualquer das subdivisões do
elemento animado pode alcançar. — A pedra é bela e bela de modos diversos. — Cada
espécie mineral tem suas harmonias e o elemento que reúne todas as harmonias da
espécie possui a maior soma de beleza que a espécie possa alcançar.
A flor tem suas
harmonias; também ela pode possuí-las todas ou insulanamente e ser
diferentemente bela, mas somente será bela quando as harmonias que concorrem
para a sua criação se acharem harmonicamente fusionadas. — Dois tipos de beleza
podem produzir, por fusão, um ser híbrido, informe, de aspecto repulsivo.
— Há então
cacofonia! Todas as vibrações, insuladamente, eram harmônicas, mas a diferença
de tonalidade entre elas produziu um desacordo, ao encontrarem-se as ondas vibrantes;
daí o monstro!
Descendo a
escala criada, cada tipo animal dá lugar às mesmas observações e a ferocidade,
a manha, até a inveja poderão dar origem a belezas especiais, se estiver sem
mistura o princípio que determina a forma. A harmonia, mesmo no mal, produz o belo.
Há o belo satânico e o belo angélico; a beleza enérgica e a beleza resignada.
Cada sentimento,
cada feixe de sentimentos, contanto que seja harmônico, produz um particular
tipo de beleza, cujos aspectos humanos são todos, não degenerescências, mas
esboços.
É, pois, certo
dizermos, não que somos mais belos, porém que nos aproximamos cada vez mais da
beleza real, à medida que nos elevamos para a perfeição.
Todos os tipos se unem harmonicamente no
perfeito. Daí o ser este o belo absoluto. — Nós que progredimos possuímos
apenas uma beleza relativa, debilitada e combatida pelos elementos desarmônicos
da nossa natureza.
Lavater (Paris,
4 de fevereiro de 1869).
Livro: Obras
Póstumas – Allan Kardec.
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