Sala de
sanatório. Ampla secretaria.
A jovem
funcionária de plantão
Ouve dois
cavalheiros da chefia,
Diretores da
casa,
Ambos em franca
zombaria,
De verbo
destilando espinho, lama e brasa,
Criticando uma
atriz,
Notada pelos
dois de maneira infeliz;
Uma atriz que
atuava em peça fescenina,
Mulher quase
menina
Que haviam ido
ver na noite precedente.
Nisso, entra na
sala
Uma pálida moça,
Pobremente
vestida,
Revelando no
todo a existência sofrida...
A todos cumprimenta
gentilmente.
Em seguida,
Procura ouvir a
funcionária em frente
E pergunta:
- Como passa meu
pai na cela do internato?
Responde a
outra, lado a lado:- Vai melhor mas precisa de cuidado...
A recém-vinda
exalta de gratidão,
Demonstra o amor
filial que traz no coração
E erguendo a
velha bolsa agora, continua dizendo:
- Vim pedir à
senhora
A conta deste
mês...
A outra estuda
as notas que se fez, investiga papéis, extrai assentos
E diz, após
somar frações e números inteiros:
- O preço total
é de novecentos mil cruzeiros.
A menina abre a
bolsa,
Preenche um
cheque, decisiva e pronta.
E imediatamente
paga a conta.
Os chefes
aproximam-se mostrando, apreço, cortesia e por sinal,
Eis que um deles
indaga:-
Senhorita,
Seu pai, há
muito tempo é um doente mental?
-Há seis anos,
senhor, vivo eu em ação
Para trazê-lo à
recuperação.
Aproveitando a
pausa, o outro diretor
Comentou sem
piedade:
-A mulher
alterou-se, minha filha, e a demência alcançou a humanidade.
Inda agora falávamos
aqui
De uma peça que
eu vi
No teatro que
temos nesta rua...
Chama-se a peça:
“A Nova Maravilha”.
Onde uma jovem
quase nua,
Mais animal que
um ser humano,
A contorcer-se
num bailado insano,
Cria tantos
convites indecentes
Que, a meu ver
Põe louco
qualquer homem deste mundo...
Seu pai decerto
viu alguma cousa destas.
Os homens, hoje
em dia,
Na mais simples
das festas,
Acham loucas
assim
E adoecem, por
fim,
Neuróticos,
cansados, infelizes,
Principalmente
olhando essas atrizes.
Essa atriz que
vi ontem, aplaudida por loucos marmanjos,
Age em cena
De modo a
enlouquecer os próprios anjos,
E ninguém a
demite, nem condena...
Porque a menina
generosa e humilde
Ali se
enternecesse e emocionasse,
Entremostrando
lágrimas na face,
O severo censor
fez pausa e perguntou:
-Acaso a
senhorita
Chegou a ver a
peça?
E terá,
porventura, aplaudido uma loucura dessa?
Mas a jovem
tristonha replicou:
-Senhor,
Não menospreze
tanto a minha dor!
Trabalho no
teatro honestamente
Para manter aqui
meu pai velho e doente...
E em choro
convulsivo, esclareceu:
- essa atriz de
que fala... Essa jovem sou eu...
Livro: Momentos
de Ouro.
Espíritos
Diversos / Chico Xavier.
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