“Havia um homem
rico que tinha um mordomo; e este lhe foi denunciado como esbanjador dos seus
bens. Chamou-o, então, e lhe disse: Que é isto que ouço dizer de ti? Dá conta
da tua administração, pois não podes mais ser meu administrador.
Disse o mordomo
consigo: Que hei-de fazer, uma vez que meu amo me tira a administração? Não sei
cultivar a terra, e de mendigar tenho vergonha. Já sei o que farei, a fim de
que, quando me houverem tirado a mordomia, encontre pessoas que me recebam em
suas casas.
Chamou cada um
dos que deviam a seu amo e perguntou ao primeiro:
Quanto deves a
meu amo? O devedor respondeu: cem cados de óleo. Disse-lhe então: Toma a tua
obrigação, senta-te ali e escreve depressa outra de cinquenta.
Perguntou em
seguida a outro: Quanto deves tu? Respondeu ele: cem cados de trigo.
Disse-lhe: Toma
o documento que me deste e escreve um de oitenta. O amo, sabendo de tudo,
louvou o mordomo infiel, por haver procedido com atilamento, porque os filhos
do século são mais avisados no gerir seus negócios do que os filhos da luz.
E eu vos digo:
Empregai as riquezas da iniquidade em granjear amigos, a fim de que, quando
elas vierem a faltar-vos, eles vos recebam nos tabernáculos eternos. Aquele que
é fiel nas pequenas coisas sê-lo-á também nas grandes, e quem é injusto no
pouco também o é no muito. Ora, pois, se não houverdes sido fiéis no tocante às
riquezas de iniquidades, quem vos confiará as verdadeiras? Se não fostes fiéis
com o alheio, quem vos dará o que é vosso?” - Jesus / Lucas, 16:1-12.
* * *
Esta parábola,
interpretada ao pé da letra, pode dar a entender que o
Mestre esteja
apontando o roubo e a fraude como exemplos de conduta dignos de serem imitados.
Considerada,
porém, em seu verdadeiro sentido, segundo o espírito que vivifica, encerra uma
profunda lição de sabedoria e de bondade que poucos hão sabido entender.
Inicialmente,
identifiquemos as duas principais personagens da historieta evangélica, e o
local em que a ação se desenrola.
O rico
proprietário é Deus, o Poder abso luto que sustenta todo o Universo; o mordomo é
a Humanidade, ou seja, cada um de nós; e a fazenda é o planeta Terra, campo em
que se desenvolve atualmente nossa evolução.
Os bens que nos
foram dados a administrar é tudo o de que nos jactamos estultamente nesta vida:
propriedades, fortuna, posição social, família e até mesmo nosso corpo físico.
Todas essas
coisas nos são colocadas à disposição pelo Supremo Senhor, durante algum tempo,
a fim de serem movimentadas para benefício geral, mas, em realidade, não nos
pertencem.
A prova disso
está em que sempre chega o dia em que seremos despojados delas, quer o
desejemos, quer não.
Nossa
infidelidade consiste em utilizarmo-nos desses recursos egoisticamente, como se
fossem patrimônio nosso, dilapidando-o ao sabor de nossos caprichos, esquecidos
de que não poderemos fugir à devida prestação de contas quando, pela morte,
formos despedidos da mordomia.
Pois bem, já que
abusamos da Providência, malbaratando os bens de que somos simples
administradores, tenhamos ao menos o atuamento do mordomo de que fala a
parábola.
Que fez ele?
Para ter quem o favorecesse, quando demitido do cargo que desempenhava, tratou
de fazer amigos, reduzindo as contas dos devedores de seu amo.
É o que Jesus nos aconselha fazer, quando diz:
“granjeai antigos com as riquezas iníquas”.
Em outras
palavras, isto significa que os sofredores de todos os matizes são criaturas
que se acham endividadas perante Deus, são pecadores que têm contas a saldar
com a Justiça Divina, e auxiliá-los em suas necessidades, minorar-lhes as dores
e aflições, equivale a diminuir-lhes as dividas, de vez que, via de regra, todo
sofrimento constitui resgate de débitos contraídos no passado.
Se assim
agirmos, ganharemos a amizade e a gratidão desses infelizes, que se
solidarizarão conosco quando deixarmos este mundo, bem assim a complacência do
Pai celestial, porque muito Lhe apraz ver-nos tratar o próximo com
misericórdia.
Não falta, aqui
na Terra, quem admire “os filhos do século” pelo fato de se empenharem a fundo,
com inteligência, denodo e sacrifícios até, no sentido de assegurarem aquilo a
que chamam “o seu futuro”.
Quão maiores
louvores, entretanto, haveriam de merecer de Deus “os filhos da luz”, os já
esclarecidos acerca da vida espiritual, se procedessem com igual esforço e
dedicação, empregando a bondade na conquista dos planos superiores, situados
além deste orbe de trevas?
Sejamos, pois,
colaboradores fiéis da Divindade, gerindo os bens materiais de que dispusermos
em conformidade com os ensinamentos sublimes que nos foram ditados por Jesus no
Sermão da Montanha; assim fazendo, estaremos acumulando, no céu, um tesouro
verdadeiramente imperecível. Sim, porque as virtudes cristãs, que formos
adquirindo no convívio com nossos semelhantes, são as únicas riquezas
efetivamente nossas, e só elas nos poderão dar a felicidade perfeita, nos
tabernáculos eternos!
Livro: Parábolas
Evangélicas.
Rodolfo
Calligaris.
Nenhum comentário:
Postar um comentário