Como pode a
alma, que não alcançou a perfeição durante a vida corpórea, acabar de
depurarse? Sofrendo a prova de uma nova
existência. Como realiza essa nova existência? Será pela sua transformação como
Espírito? Depurando-se, a alma indubitavelmente experimenta uma transformação,
mas para isso necessária lhe é a prova da vida corporal. (Livro dos Espíritos –
Allan Kardec, questão 166)
Dar-se-á o
fato de se isentar alguém dos impulsos e inquietações sexuais, simplesmente por
haver assumido compromissos de natureza religiosa? Claro que a lógica responde
no espírito de sequência da natureza. A criatura que abraça encargos dessa
ordem está procurando ou aceitando para si mesma aguilhões regeneradores ou educativos,
de vez que ordenações e providências de caráter externo não transfiguram
milagrosamente o mundo íntimo. As realizações da fé, por isso mesmo, se
concretizam à base de porfiadas lutas da alma, de si para consigo.
Ninguém se
burila de um dia para outro. De que modo alienar condições inerentes à própria
vida do Espírito, acalentadas, no curso das eras, tão somente em função de
afirmativas verbais? E entendendo-se que as leis do Universo não destroem o
instinto, mas transformam-no em razão e angelitude, na passagem dos evos, pelos
mecanismos da sublimação, de que forma exigir a extinção dos estímulos
genésicos em alguém, tão só porque esse alguém se consagre ao Serviço Divino da
Fé, quando esses mesmos estímulos são ingredientes da vida e da evolução,
criados pela mesma Providência Divina para a sustentação e a elevação de todos
os seres? Compreendida a inalienabilidade dos problemas sexuais nas
individualidades representativas das ideias religiosas no mundo, é mais que razoável
considerar que essas individualidades, em grande maioria, solicitaram para si
próprias os controles de feição moral a que transitoriamente se vinculam, no
tentame de extraírem deles o proveito máximo, a favor de si próprias.
Efetivamente, Espíritos superiores e já erguidos a notáveis campos de elevação,
unicamente por amor e sacrifício, tomam assento nas organizações religiosas da
Terra, volvendo à reencarnação em atividades socorristas, nas quais impulsionam
o progresso dos seus irmãos. Esses missionários do devotamento vibram em faixas
de amor sublime, quase sempre inacessível à compreensão dos seus
contemporâneos. Não ocorrem análogas circunstâncias entre aqueles outros que
renascem sob regime disciplinar, requisitados por eles contra eles mesmos, de
vez que grande número desses obreiros das ideias religiosas, reencarnados em
condições de prova, demonstram dificuldades e inibições múltiplas, no corpo e
na mente, quando não sofrem exagerada tendência aos desvarios sexuais –
tendência essa que habitualmente os mantém recolhidos ao medo de qualquer
expansão afetiva. Temendo as manifestações do amor e bastas vezes condenando
indebitamente os companheiros da Humanidade, pelo fato de se acomodarem a
uniões respeitáveis e dignas, na generalidade receiam a si próprios e censuram
os semelhantes, no impulso inconsciente de lhes copiar a independência e a
conduta. Daí surgem os incidentes menos
felizes quantas vezes! – em que vemos expositores ardentes e apaixonados, dessa
ou daquela idéia religiosa, tombando em experiências emotivas, muito mais
complicadas e deploráveis do que aquelas outras que eles próprios reprovavam no
caminho e na vida dos companheiros!... Aliás, registre-se que o fenômeno é mais
que justo, porquanto, aceitando os distintivos de determinada seara religiosa,
o Espírito impõe a si mesmo um fator de frenagem e auto-policiamento, sem que
as marcas exteriores de fé signifiquem mais que um convite ou um desafio a que
se aperfeiçoe, de acordo com os princípios de acrisolamento que abraça.
Instruções religiosas exteriores não alteram, de improviso, os impulsos do
coração, conquanto se erijam em fortaleza de luz, amparando a criatura que a
elas se acolhe para o serviço de auto-aprimoramento. Qualquer professor na
Terra há de se identificar com os alunos, no campo das experiências naturais do
cotidiano, a fim de que se estabeleça, entre eles, o fio da compreensão mútua,
unindo vanguarda e retaguarda do esforço para a escalada do grupo ao conhecimento.
Um anjo e uma equipe de criaturas humanas não entrariam em relacionamento ideal
para rendimento ideal do ensino. À vista disso, somos nós mesmos, Espíritos
endividados ante as Leis do Universo, que nos enlaçamos uns com os outros,
encarnados e desencarnados, aperfeiçoando gradativamente as qualidades próprias
e aprendendo, à custa de trabalho e tempo, como alcançar a sublimação que
demandamos, em marcha laboriosa para a conquista dos Valores Eternos.
Livro: Sexo e Vida.
Emmanuel / Chico
Xavier.
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